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quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

EUGÉNIO DE ANDRADE ( 19 Janeiro 1923-13 Junho 2005 )


© Jorge Pinheiro



SONETO


AMOR DESTA TARDE QUE ARREFECEU

AS MÃOS E OS OLHOS QUE TE DEI;

AMOR EXACTO, VIVO, DESENHADO

A FOGO, ONDE EU PRÓPRIO ME QUEIMEI;


AMOR QUE ME DESTRÓI E DESTRUIU

A FRIA ARQUITECTURA DESTA TARDE

- SÓ A TI CANTO, QUE NEM EU JÁ SEI

OUTRA FORMA DE SER E DE ENCONTRAR-ME.


SÓ A TI CANTO QUE NÃO HÁ RAZÃO

PARA O FRIO QUE ME QUEIMA OS OLHOS

ME TRESPASSE E ME SUBA AO CORAÇÃO;


SÓ A TI CANTO, QUE NÃO HÁ DESASTRE

DE ONDE NÃO POSSA AINDA ERGUER-ME

PARA ENCONTRAR DE NOVO A TUA FACE.

 

( Eugénio de Andrade, in Os Amantes sem dinheiro