Como prometido, aqui está
A LENDA DO GALO DE BARCELOS
Há muitos, mas mesmo muitos anos atrás, numa povoação
(que hoje é a cidade de Barcelos), a população de um momento
para o outro deixou de viver tranquila e em paz.
As pratas e o ouro do homem mais rico do lugar tinham sido roubadas!
A desconfiança instalou-se entre todos. Um era o ladrão, de certeza!
Mas quem entre todos? Este, aquele ou aqueloutro?
Seria o Zé da Adega? Ele devia dinheiro a todos...
Seria alguém de fora? Quem ia saber?
E não é que nestes entretantos não encontram um moço galego
que por aquelas bandas andava a passear?
Logo de suspeito, passou a ser o único alvo de todas as acusações.
O rapaz bem reclamava a sua total inocência, que só nessa manhã ali chegara...
Que importavam as declarações da sua inocência?
Tinha que ser ele, já que todos os outros eram gente honesta...
À força foi levado a casa do juiz que já se encontrava
sentado à mesa para um magnífico galo assado comer.
O moço continuava a protestar: Não fui eu, não fui eu!!!
A veemência das suas palavras nada alterou.
Desesperado, pois já pensava que a pena de morte lhe seria decretada,
tentou uma última chance:
-A todos já afirmei que estou inocente do que me acusam.
Mas se em mim não acreditam, eu vos digo que este galo
ali na mesa e já assado esta noite cantará a minha inocência!
Claro, todos fizeram chacota e as gargalhadas não faltaram.
E o juiz determinou que o levassem para a cadeia e que na manhã seguinte
ele iria sofrer o castigo adequado a tão grave acto.
O juiz voltou a sentar-se à mesa e muito aborrecido estava com o atraso
que aquele caso originara.
Puxou a travessa para si e, quando se preparava para trinchar
o galo, não é que um forte e sonante
Cocorococó...Cocorococó...Cocorococó...
solto pelo assado bicho, não faz que o juiz caia da cadeira com o susto?
Logo deu imediata ordem à sua criadagem para irem soltar o rapaz,
já que ele próprio ouvira o galo cantar.
É esta a lenda. Outras versões há, naturalmente.
Até talvez mais verosímeis:
O galego seria um romeiro de Santiago bem parecido e que
a estalajadeira se tomara de amores e procurara tentá-lo
à noite no quarto que ao rapaz alugara.
Como este prometera às tentações da carne não ceder
enquanto a peregrinação não terminasse, a estalajadeira
de vingança meteu na sacola do rapaz os talheres de prata.
E, quando ele a sair, gritou bem alto para que toda a povoação ouvisse:
AQUI D'EL-REI, QUE É LADRÃO!
O final da lenda é idêntico, com a agravante que logo ali o juiz
decidiu que a forca era o castigo.
Na verdade, em frente à matriz de Barcelos existe um cruzeiro
na coluna do qual se vê esculpido um galo, um enforcado e Santiago.
Esta lenda, francesa ao que parece, está documentada em vários
pontos dos Caminhos de Santiago.
Quem não conhecia a lenda, fica agora a saber a razão
da existência do Galo de Barcelos.
Espero que tenham gostado.
Só lamento as réplicas
de mau gosto que a original peça tem vindo a
conhecer nestas últimas décadas...
Conheço ainda outra, bem diferente desta anterior.
Ter-se-á passado em Vila Nova do Laranjal, perto de Ponte de Sor, no Alto Alentejo e tem a ver com o melhor galo que seria guardado e tratado pelo homem melhor da terra para cantar na Missa do Galo.
Uma vez, apresentaram-se dois homens. Ambos se reclamavam como o melhor homem bom.
O meirinho (ou juiz) pergunta se algum deles pode apresentar uma testemunha do que eles fizeram de bom e de bem.
Ambos apresentam a mesma testemunha, para espanto do juiz.
Tratava-se da menina do Laranjal, a mais bonita, a mais respeitada, mas também a mais rica de toda aquela zona.
Depois de umas peripécias - que aqui me dispenso de narrar para não alongar demasiado o texto - a menina fica noiva daquele que fora escolhido para engordar o galo para a Missa da Meia-Noite, do dia de Natal.
Porém, na véspera desse dia o galo desapareceu misteriosamente!
O juiz entendeu que o responsável pela engorda do galo era também o responsável pela sua guarda e, como tal, logo foi condenado á forca.
Naturalmente afirmou a sua total inocência mas a firmeza do juiz manteve-se.
Já a menina do Laranjal chorava a perda do seu amor quando uma ideia surgiu ao pobre e amargurado...
Assim, quando o meirinho permitiu que o condenado formulasse o seu último desejo, ele pediu que levassem a menina do laranjal ao alto da torre da igreja.
Quando a menina do Laranjal subiu à torre, logo se ouviu o galo cantar três vezes.
O povo correu para o local donde viera o cantar do galo. Era o quintal do outro rival.
Ficara provada a sua inocência! A sua ideia salvara-lhe a vida e devolvera-o á sua amada menina do Laranjal.
A lenda não nos diz o que sucedeu ao rival que furtara o galo ao inocente acusado...