© João Menéres
AS GLICÍNIAS
nos alpendres de junho perpassa
um halo azul a desprender-se em cheiros
que procuram a terra devagar
numa gaze de luminescências e de abelhas.
é quando cresce a música na intimidade
das glicínias e se despenha o seu perfume
nas sombras mais intensas, como se
falássemos das águas ou da matéria da melancolia
nesta luz feita de sussurros do jardim e
o mundo começasse pelas narinas
e o nó da vida se prendesse
ao voo de um aroma, à sua consciência doce,
arejada entre o chão e as nuvens
desce pelos vãos da solidão macia, lento
como um óleo a alastrar na pele do tempo,
o enredamento grave das glicínias,
para um torpor, para um renascimento,
para uma canção breve das delícias,
um recordar de mágoas, um cacho de silêncios,
um respirar mais fundo, um habitar.
( Vasco da Graça Moura, in ALAMEDA DAS GLICÍNIAS,
editado pela Modo de Ler / 2015 )